Laranja mais cara: preço sobe quase 40% em SP provocado por estoque menor, praga e mudança climática

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Laranja mais cara: preço sobe quase 40% em SP provocado por estoque menor, praga e mudança climática

Um dos símbolos do Brasil, o suco de laranja é onipresente no cardápio dos brasileiros, seja no café da manhã, no almoço ou no jantar. Nos últimos mes

São Paulo, maior produtor de laranja do mundo, ainda tem áreas para crescer, diz instituição
Laranja paulista migra para outros Estados para escapar de praga; novas áreas investem em controle
Laranja paulista migra para outros Estados para escapar de praga; novas áreas investem em controle

Um dos símbolos do Brasil, o suco de laranja é onipresente no cardápio dos brasileiros, seja no café da manhã, no almoço ou no jantar. Nos últimos meses, no entanto, o produto (seja o suco de laranja como a laranja) sumiu das prateleiras, o que tem provocado uma escalada dos preços. Por trás do movimento está uma série de desafios enfrentados na produção agrícola, como a queda da colheita por causa das mudanças climática e o avanço de pragas. Junta-se a isso, uma demanda maior pelo fruto em mercados emergentes na Ásia e Oriente Médio. Oferta menor e procura maior resultam em alta de preços.

Em uma década, a produção do suco de laranja despencou mais de 50% e reduziu os estoques. Além das questões climáticas, a escassez também é causada pelas pragas que assolam as lavouras, a exemplo do greening que tem levando produtores a migrar de região, ou até mudar a operação para outras culturas.

O coordenador dos índices de preço na FGV, André Braz, afirma que a taxa acumulada no custo da laranja em 12 meses avançou mais de 30%, chegando a 38% no Estado de São Paulo. A alta está ligada ao aumento de todo tipo de custos de operação, como proteção dos laranjais contra pragas, logística de colheita e transporte da mercadoria.

“As mudanças climáticas oferecem um desafio global ao agronegócio, não é só o Brasil que está sendo afetado. Recentemente, muito se falou do azeite, que teve uma quebra de safra na Europa, principalmente na Espanha, Portugal e Grécia, que são os grandes produtores mundiais do produto”, diz Braz. Isso provocou a alta de preço do azeite, que é mais ou menos a mesma história da laranja.

A redução da colheita tem reflexo direto no estoque de suco de laranja. Levantamento da Associação Nacional dos Exportadores de Sucos Cítricos (CitrusBR) aponta que, em 2023, o Brasil registrou o segundo menor nível de estoques em 13 anos. Ao todo, no ano passado, o País produziu aproximadamente 463 mil toneladas do produto, um crescimento de 6,7% na comparação com o produzido em 2022. Apesar de não existir um perigo iminente de “extinção” da bebida, o cenário de problemas afeta o preço e a disponibilidade do item na mesa dos brasileiros e de outros mercados.

De acordo com os últimos dados do Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), em março deste ano, a fruta manteve uma trajetória de alta nos preços. Enquanto o índice geral para o período foi de 3,93%, as variedades de laranja, baía, lima e pera registraram inflação, respectivamente, de 16,24%, 37,89 e 39,16%.

Produção da laranja cai e preço sobe nos supermercados Foto: Serjão Carvalho/Estadão

O diretor executivo da CitrusBR, Ibiapaba Netto, conta que dois fatores primordiais explicam os resultados baixos da safra da laranja, da produção dos sucos no País e do preço mais alto para o consumo in natura da fruta. O primeiro deles já é algo conhecido no Brasil há 20 anos, o greening, que é uma praga que afeta os laranjais e pode dizimar hectares inteiros de plantação da citricultura. O segundo, também presente em outras áreas da agricultura no País: o aquecimento global.

“O greening é uma preocupação, a maior que temos até agora, mas o resultado de estoques tem mais a ver com o clima nos últimos anos do que com a presença da praga”, diz ele. “Até essa última safra nós tínhamos uma preocupação com o greening, hoje o resultado que nós temos da safra baixa é muito em decorrência do clima.”

O que é o greening?

A engenheira agrônoma e professora do curso de agronomia da Facens, Jéssica Silva, explica que a doença que afeta as plantações de laranja no mundo é causada por uma bactéria, possivelmente originária da China, que é transmitida por um inseto, conhecido como Psilídeo Diaphorina Citri. Ela aponta que, por se tratar de uma doença cujo vetor é um inseto, o controle da praga precisa ser feito através do combate do Psilídeo Diaphorina Citri.

“É um inseto bem pequeno, que encontra no Brasil um lugar muito produtivo para a reprodução por causa da umidade e da temperatura”, diz. “No fim do dia, o Brasil é uma terra fértil para todo tipo de insetos, tanto para doenças de humanos quanto de plantas.”

Outro problema associado ao greening é a alta adaptabilidade do inseto vetor da doença, já que com o passar do tempo, novas levas dele vão se tornando imunes a diversos defensivos disponíveis no mercado agrícola, o que torna o combate a essa praga mais complexo.

Laranja contaminada pelo greening no interior de São Paulo
 Foto: Foto Joel Silva/ Estadao

“Quando você expõe sucessivamente o inseto a uma mesma molécula de produto defensivo, eventualmente, você pode esbarrar em indivíduos que tenham ganhado resistência a essa composição, aí ele reproduz e passa esse gene de resistência ao defensivo para novos insetos,” afirma a professora de agronomia, que complementa. “Nós chamamos de ‘Teoria da Rainha Vermelha’, o tempo todo correndo cada vez mais rápido para ver quem ganha; é o que acontece com pragas e doenças e defensivos agrícolas.”

Conforme adiantou o Estadão, por causa dos estragos causados na plantação, citricultores paulistas estão migrando os pomares para Estados ainda livres da praga. Atualmente o polo citrícola brasileiro está concentrado nos Estados de São Paulo, com 77% da produção nacional, Minas Gerais e Paraná, região conhecida como “Cinturão Cítrico”.

Impacto do clima

Netto, da CitrusBR, pontua que a instabilidade climática gerada pelo aquecimento global tem castigado particularmente mais a região conhecida como “cinturão cítrico”, que corresponde a produção registrada entre os Estados de São Paulo, Minas Gerais e Paraná. Ele lembra que os produtores do País esperavam uma safra positiva entre 2021 e 2022, mas os resultados ficaram aquém do imaginado devido aquela que foi vista como uma das piores secas para a região nos últimos anos.

“Nós tivemos uma das piores secas da história recente. Regiões que mesmo com irrigação artificial não havia água suficiente no solo para salvar a planta. Foram áreas inteiras perdidas pela seca”, lembra.

Para Braz, da FGV, os problemas que o agronegócio enfrenta devido ao clima não têm solução simples, afetam diferentes plantios e ainda devem dar dor de cabeça aos produtores. “Os desafios climáticos estão aí e a tecnologia vai ter de ajudar a agricultura a driblá-los. Agora, não dá para driblar as secas intensas, as ocorrências de pragas ou então os alagamentos. Os extremos climáticos são complexos e desafiam praticamente todas as culturas.”

Se nos últimos anos as plantações de laranja foram afetadas, em grande parte, pelos efeitos do aquecimento global e do El Ninho, em 2024, os agricultores terão de lidar com outro fenômeno natural: o La Niña. Mais um evento climático que pode afetar a disponibilidade de chuvas e com isso alterar os resultados das plantações para produção de suco e comércio do fruto in natura.

Demanda em alta

Outro fator conjuntural que tem pressionado os preços do suco e da laranja no País é o aumento na demanda pelo produto em diversos mercados emergentes, a exemplo de países da Ásia e Oriente Médio, e até no Brasil, como explica o economista-chefe do Banco Pine, Cristiano Oliveira. “Um fator estrutural da escassez na oferta de laranja se dá porque esse é o típico investimento que demora a maturar. O aumento da produção demora, exige um investimento e tempo. Imagine começar uma plantação do zero. Existe uma oferta que cresce num ritmo menor do que a demanda”, avalia o executivo.

O economista afirma que esse aumento na demanda está relacionado ao crescimento da renda no País, puxado pela correção do salário mínimo acima da inflação no Brasil, e também pelo aumento no poder de compras em outros mercados emergentes. “Depois de muito tempo, nós tivemos um aumento do salário mínimo e o recuo da inflação no País, o que gera um consumo maior de suco.”

Oliveira ressalta ainda que a junção de fatores como o apetite do importador pelo produto brasileiro e a depreciação do real ante ao dólar também pode afetar o preço e a disponibilidade do item nas prateleiras. “Na ótica do produtor é um cenário produtivo, pois o Brasil exporta suco de laranja, ele pega um aumento de preço no País e no mundo, tudo isso em meio a uma depreciação do câmbio do real”, afirma o economista.

Fonte: Externa