Intervenções de Elon Musk serviram para transformar em briga na lama um debate muito importante

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Intervenções de Elon Musk serviram para transformar em briga na lama um debate muito importante

Não há dúvida da importância de se debater, no Brasil ou em qualquer lugar no mundo, o quanto órgãos judiciais e a própria sociedade podem ou devem av

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Não há dúvida da importância de se debater, no Brasil ou em qualquer lugar no mundo, o quanto órgãos judiciais e a própria sociedade podem ou devem avançar sobre a liberdade de expressão para coibir a prática de crimes ou ataques às instituições democráticas. Em tempos de polarização exacerbada e em um momento como o que vive o Brasil, após ataques físicos às sedes dos Três Poderes e relatos fartos da articulação de uma trama golpista, não é trivial debater o assunto. Mas quando Elon Musk resolveu despejar um misto de distorções e ataques direcionados nas redes sociais, em aliança com parlamentares bolsonaristas, tal discussão foi para o nível de briga na lama.

Elon Musk empurrou debate sobre liberdade de expressão e combate ao crime no Brasil para a briga na lama Foto: Nathan Laine/Bloomberg

É inegável que Musk e o autointitulado “Twitter Files” aumentaram bastante o barulho sobre o tema, inclusive em nível internacional. Também trouxeram duas consequências de ordem inversa nos Poderes, com o enterro do atual PL das Fake News na Câmara, e a aceleração da discussão no STF sobre pontos do Marco Civil da Internet. Para o bolsonarismo, serviu também para reativar até mesmo as teorias da conspiração sobre as eleições de 2022.

Mas de concreto, efetivo, de prova, documento ou relato, o que se trouxe que tenha mudado o cenário fático do debate sobre liberdade de expressão x atuação do STF nas redes sociais? Ao que parece, nada. Há um amontoado de informações, algumas verídicas, mas já de longe conhecidas, como a pressão que o TSE impôs sobre as plataformas, via resolução oficialmente divulgada, para que fosse ágil na retirada de conteúdos que violassem a legislação.

Há também relatos totalmente distorcidos ou mentirosos, como a indicação de que foram “Alexandre de Moraes e outros funcionários do governo brasileiro” os responsáveis por ameaçar de processo o advogado do X Rafael Batista, como afirmou nas redes o autor do “Twitter Files”, Michael Shellenberger. A investigação era do Ministério Público de São Paulo (MPSP) e tratava-se da exigência de revelar dados sobre integrantes do PCC, que o X rejeitava fazer. O caso foi levado pela Promotoria ao TJ-SP, que deu razão ao advogado.

Também é mentira que Moraes tenha soltado Lula da cadeia, como disse o próprio Elon Musk em sua rede. A decisão que tirou o petista da Superintendência da Polícia Federal em Curitiba foi a que barrou a prisão em segunda instância. Alexandre Moraes votou a favor da prisão e, portanto, contra os interesses de Lula. Quando o petista já estava solto, ainda inelegível, surgiu a decisão que anulou os processos sob a alegação de incompetência da 13ª Vara em Curitiba. Nesse caso, Moraes votou nesse sentido, mas, repito: Lula já estava solto. Moraes não tirou Lula da prisão como diz Musk.

Esse debate eivado de carga ideológica e com essas confusões e distorções, não contribui para o aprofundamento sobre os verdadeiros pontos sob os quais a sociedade brasileira deveria se debruçar. A guerra na lama atrasa o esperado fim do inquérito das milícias digitais, polêmico desde que foi aberto pelo STF, por incluir quase todo assunto que diga respeito ao bolsonarismo e ser relatado por aquele que talvez seja a principal vítima dos ataques perpetrados pelo grupo que é investigado. Também deixa pouca margem para que se busque um texto de consenso sobre como a sociedade e a Justiça devem lidar com as redes. E, mais que isso, ofusca os verdadeiros problemas e crises no País.

A reação do STF, com a inclusão de Musk no inquérito das milícias digitais e com a abertura de investigações pela Polícia Federal foi feita sem que a pergunta fundamental para que fizesse sentido fosse respondida: afinal, o bilionário e sua empresa descumpriram alguma decisão judicial ou só ficaram na bravata? Responder a essa pergunta deveria ser uma prioridade das autoridades brasileiras antes de aceitar a provocação e entrar na luta corporal proposta por uma figura exótica disposta a arrumar confusão por onde passa.

Fonte: Externa